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Um dia de cada vez


Nos últimos meses o meu filho tem vindo a evoluir imenso, principalmente a nível de comunicação. Utiliza os diálogos nos momentos correctos, faz frases muito completas, em que apesar de, por vezes, não se compreender na perfeição aquilo que ele diz conseguimos perceber perfeitamente qual a ideia e o que quer saber ou dizer. Se há um ano atrás me dissessem que hoje ele estaria assim confesso que não acreditaria. Não conseguiria imaginar que por exemplo ele tivesse vontade de saber o que estou a fazer, que conseguisse expressar que gosta de nós, que está triste ou feliz.

No início de tudo isto a Terapeuta Ocupacional explicou-nos que ao longo da vida dele teria altos e baixos, “dois passos em frente e um para trás”, por isso todos os dias em que algo corre mal tento dizer a mim mesma que depois serão dois em frente. Dois em frente na comunicação, intenção de discurso, socialização. Mas há sempre aquele um para trás que reflecte a ansiedade, inquietação, impaciência, tolerância.

O momento que todos temos vivido implica uma série de mudanças a que nos temos que adaptar e não é fácil. Principalmente para as crianças e mais ainda para aqueles que precisam da sua rotina apertada, da previsibilidade, como é o caso de muitas crianças com neurodiversidade, como é o caso também do meu filho.

Resta-nos tentar que, dentro do possível e tendo em conta as limitações que temos vivido neste último ano, a vida destas crianças seja o mais normal possível e esperar que rapidamente tudo fique mais estável para que eles e todos nós voltemos a ter uma vida sem tantas privações.

No nosso caso, podemos encontrar coisas positivas nesta mudança, como o meu filho ter passado a ter mais tempo de trabalho de um para um, o que em muito contribuiu para esta sua evolução, mas depois ter tido momentos em que deixou a escola, passou a estar sempre em casa, a ver os amigos e educadoras pelo computador, terapeutas em contexto online, privação de contacto com os poucos elos de ligação que tem, sair menos, são tudo coisas que destabilizam o mundo dele e que o deixam confuso. E por isso, às vezes, os nossos dias fazem-me lembrar um bocadinho o início da Primavera, umas árvores ainda despedidas e outras com pequenas ramagens verdes prontas a despontar.

Nestes tempos, temos um menino que tanto tem para dizer, mas que muitas vezes está tão nervoso e tão assoberbado a processar os seus sentimentos que só verbaliza frases e sons repetidos ou falas de desenhos animados. Esta é uma forma regulatória que o cérebro dele utiliza para se organizar. (Em breve farei um post sobre este tema tão importante.)

No final de cada dia, depois de o deitar e de lhe ler uma história (coisa que até há um ano atrás ele não permitia), depois de finalmente sentir que, agora, ele gosta quando o abraço, é tempo de ficar um pouco sozinha e fazer um reset ao meu cérebro e acreditar que amanhã será um dia mais positivo, um dia de conquistas, de alegrias, de dúvidas, mas também, esperemos, de certezas.

Um dia de cada vez.


Rita

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